Lei que proíbe carroças em BH entra em vigor em quatro meses e gera debate entre defensores dos animais e carroceiros
14/09/2025
(Foto: Reprodução) Lei que proíbe tração animal em BH entrará em vigor em janeiro de 2026
A lei que proíbe a circulação de veículos de tração animal em Belo Horizonte entra em vigor em 22 de janeiro de 2026, dentro de quatro meses, e divide opiniões na capital.
Enquanto entidades de proteção animal consideram a medida um passo importante para garantir a dignidade dos cavalos, carroceiros afirmam que a mudança ameaça uma tradição e coloca em risco o sustento de centenas de famílias.
A lei foi aprovada em 2021, com prazo inicial de dez anos para adaptação, mas sofreu alteração em 2023, antecipando a vigência em cinco anos.
A norma foi criada com foco no bem-estar dos cavalos, mas tem gerado preocupação entre carroceiros que dependem da atividade para viver.
Segundo a Comissão de Direitos dos Animais da Câmara Municipal, a cada 72 horas um cavalo vítima de abandono ou maus-tratos é apreendido na capital.
Muitos puxam cargas com excesso de peso, sem alimentação adequada ou cuidados veterinários, e são abandonados quando não conseguem mais trabalhar.
Entre o alívio e a ameaça
A presidente da ONG Brasil pelos Cavalos, Fernanda Braga, considera a decisão um marco.
"Eu vejo esse cenário de Belo Horizonte como um cenário que se apresenta histórico em todo o Brasil, porque na contramão de todo o país que dilatou os prazos de proibição, nós conseguimos não só aprovar uma lei de proibição de carroças numa das capitais mais problemáticas e emblemáticas quanto ao tema, quanto conseguimos reduzir esse prazo", afirmou Braga.
Já os carroceiros afirmam que a medida ameaça a sobrevivência de famílias inteiras. O presidente da Associação dos Carroceiros, Sebastião Alves Lima, lembra que trabalha com cavalos desde a infância.
"Um trabalho que nos honra muito, que nos dá o sustento de levar o pão pra casa de cada dia e que nos traz também o benefício da nossa comunidade porque nós somos uma comunidade de carroceiros e carroceiras. Eu sou da etnia Calon, vim de um povo que ama estar junto dos animais, então pra nós o imposto da lei agora seria uma destruição", alegou o carroceiro.
Carroça em Belo Horizonte.
TV Globo
500 carroceiros cadastrados
A Prefeitura de Belo Horizonte possui cerca de 500 carroceiros cadastrados, mas estima que o número real seja maior.
De acordo com o secretário municipal de Meio Ambiente, João Paulo Menna Barreto, a administração está atualizando o cadastro para oferecer suporte durante a transição.
"A PBH tem cadastrados 500 carroceiros e a gente estima que este número seja bem maior. A gente está buscando atualizar esse cadastro, é determinação expressa do prefeito Álvaro Damião para que janeiro de 2026 a cidade de BH esteja pronta para promover essa alteração. Não deixando de forma desassistida, ou seja, assistindo de forma permanente e integral não só animais como carroceiros e as suas famílias", declarou o secretário.
A PBH informou, também, que uma comissão intersetorial está sendo criada para avaliar os impactos da lei. Ainda segundo a administração, esse grupo vai estudar alternativas para os trabalhadores impactados, para promover uma transição harmoniosa.
Incertezas
Entre os trabalhadores, a incerteza predomina. O carroceiro Eric Martins Alves teme não conseguir sustentar os filhos após a mudança.
"Eu tenho três meninos pra criar, pequenos, e um salário mínimo não dá pra mim cuidar deles. Não me adaptei a trabalhar fichado, o único lugar que eu me adaptei foi na minha carroça, tenho meus clientes...", desabafou o carroceiro.
Eric também se preocupa com o destino dos animais.
"Eu não tenho garantia nenhuma que eles vão ser bem tratados, vão ser bem cuidados, quem vai garantir que o amor que eu dou pra eles a outra pessoa que vai cuidar deles vai dar? Isso sim é maus-tratos", defendeu.
Em meio à polêmica, Fernanda Braga reforça o argumento dos defensores dos animais.
"Esses cavalos aguardam há muito tempo para que possam ter seus direitos e sua dignidade garantidos", afirmou a presidente da associação.
Enquanto isso, lideranças de carroceiros pedem alternativas e compensações financeiras para quem perderá a principal fonte de renda.
"Meu uso e costume, eu nasci e me criei nisso, já tentei outras e não deu certo, não consegui desempenhar. Se eles vão colocar alguma coisa que seja coisa que nos atende, então nos aposenta, manda o subsídio e estaremos aí para cumprir a lei", resumiu o presidente da associação dos carroceiros.
O presidente da Associação dos Carroceiros, Sebastião Alves Lima.
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